quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

Toda palavra minha - CHICO ARAUJO


Poderá até parecer algo profundamente estranho, mas esse monólogo ocorreu. Dois amigos, sentados frente a frente, um bar acolhendo-os, cerveja nos copos se enchendo e reenchendo. Atenção e tensões em alternância. Sem desistência de nenhum, até o ponto final...
Toda palavra minha é um gesto meu de enfrentamento de minha realidade, que é única. Pessoal. Intransferível.
Todo verso construído, todo parágrafo desenvolvido é uma possibilidade revolucionária de me significar e permanecer existente. Resistente. Resiliente.
É pela palavra e é com a palavra que me substantivo.
A um só tempo criadora e criação, ela me tece meus pormenores, meu âmago, meus extremos.
Ao mesmo instante, conflito e solução, pensamento e revelação, o solo e a imensidão. Tatear e superar; superação e involução.
Silêncio e grito, grito e silêncio. Achados e perdidos. Invento, invento-me, desconstruo-me íntegro a ela; desinvento, desinvento-me, reconstruo-me amalgamado nela. Sou e não sou – concreto e abstrato, subjetivamente implícito, um esgueirar-se entre o sim e o não.
Algumas vezes dá vontade de falar, mas emerge, abruptamente, um abismal desejo de nada dizer. Mais ou menos pelo seguinte ponto - sem exatamente de equilíbrio: o que pretendo dizer será compreendido como deveria ser entendido? Presunção minha? Arrogância? Não sei. Receio, com certeza.
Ela, a palavra, quer e não quer se revelar. Ilude-me, em seu ruinoso jogo de esconde-esconde de sentidos.
Uma palavra certa, se certeira, pode acolher; também pode lançar sua ideia – e mesmo alguém – ao limbo, em sentido reverso, oposição tenaz, débil, apequenação.
Eu garimpo palavras em universos vários, na pretensão de ser preciso, certeiro. O problema maior da garimpagem é que nem sempre a bateia se encontra com a riqueza. Garimpo... teimoso, em repertórios móveis... refratários...
Repito, toda palavra minha é um gesto meu de enfrentamento.
É um embate.
É formação, então é gêneses, em qualquer dia, em algum dia.
Em algum instante preciso. Meu "instante já!".
Meu tempo, preciso; a palavra sendo, acaba, acaba sendo.
Eu bem no meio – minha existência consistente em momento líquido.

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Chico Araujo publica toda quarta-feira aqui no Evoé! O título "A interrogação para mais adiante..." foi escrito entre 2 e 3 de janeiro de 2018. Leia mais Chico Araujo no blog Vida, minha vida...

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