segunda-feira, 11 de setembro de 2017

DIREITOS AUTORAIS: UMA VELA PARA DEUS OUTRA PARA O DIABO? - Túlio Monteiro

Na época atual, convencionou-se chamar de globalização tudo o que se refere ao encurtamento de distâncias e "interesses conjuntos"; das nações do Mundo. Balelas soltas ao vento para que o antropofágico império norte-americano derrube, através de sua tecnológica ditadura de ponta, as fronteiras e direitos dos povos desse planeta, à exceção dos deles, claro!

Por falar em direitos, nada melhor que os discutirmos na sua quintessência: a dos direitos autorais. Para começarmos, faz-se necessário saber o que são, como são e para que servem esses tais direitos que, última bandeira ainda asteada contra a tal ditadura a qual me referi há pouco, bravamente insistem, apesar de aviltados, em resistir aos dominadores poderios globalizantes.

É tido como direito autoral o domínio que pessoas físicas exercem sobre suas criações – comprovadamente inéditas – nos mais variados campos do intelecto humano, leia-se científicos, literários ou artísticos de modo abrangente. Ou seja, se eu crio, se você cria, temos o direito, pois, de registrarmos essas obras em entidades especializadas, qual filhos que colocamos no mundo, "patenteando-as"; como nossas. Há, no entanto, uma pequena diferença entre a comparação que fiz: filhos não delegamos a outros como mercadoria de escambo, já os direitos autorais podem ser transmitidos a um ou a novos titulares para que esses os explorem por um período nunca superior a 70 após a morte de seu autor. Ou seja, decorridos 70 anos de sua criação e registro, determinada obra deixará de pertencer ao seu autor ou herdeiro(s) deste, tornando-se obra de domínio público, por consequência, patrimônio da humanidade.

Mas, quem controla o cumprimento, limitando-nos ao Brasil, do respeito aos direitos autorais? De maneira um tanto capenga, até porque país nenhum consegue gerir esse processo de fiscalização de modo absolutamente eficaz, temos cá como órgão responsável por esse trabalho hercúleo o Escritório de Direitos Autorais da Fundação da Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro.

Fundado em 1898, através da Lei 496 (Lei Medeiros de Albuquerque), da Primeira República do Brasil, o EDA-BN funciona como cartório de registro de obras intelectuais, hoje apoiado nos trâmites do artigo 7º da Lei 9.610/1998, que trata da regulamentação dos direitos contemporâneos do autor e seus conexos (herdeiros cíveis). Em outros termos resumindo, aos marinheiros de primeira viagem que trazem à luz suas produções intelectuais, convém o imediato registro de suas "crias" no EDA-BN, que emite um certificado comprovando a data e autor ou autores de uma ou mais obras, o que lhes delega poderes constitucionalmente reconhecidos sobre seus rebentos intelectuais. O EDA pode ser contactado no seu endereço, sito à Rua da imprensa, 16/1205, Centro, Rio de Janeiro - RJ, ou através, para os mais antenados, do site (eu prefiro sítio) da www.bn.br.

Permitam-me ser carrasco, entretanto, da Lei 9.610/1998, que afirma serem protegidas através dela as "criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro" (artigo 7º). Como essa Lei é imensa, sugiro aos nobres intelectuais de plantão uma acurada pesquisa sobre ela, que é dotada de quase 100 artigos, sem contar seus muitos incisos. Coisa pra ensandecer competentes advogados, imaginem nós, pobres artistas e executores do raciocínio direcionado ao inédito. Muito cuidado, portanto, quando de sua consulta. Há cascas de banana por todos os lados.

Uma vela para Deus outra para o Diabo, essa Lei que, como toda Lei que se preza, bate com uma mão e acaricia com a outra. Se o artigo 7º prevê que são obras intelectuais protegidas os textos gerados a partir de criações literárias, artísticas ou científicas, leia-se: livros, conferências, alocuções, sonorizações, ilustrações, desenho, pintura, escultura, fotografia, cenografia, músicas, sermões, cartas geográficas, arquitetura, compilações, antologias etc, o artigo 8º dessa mesma famigerada Lei faz questão de deixar claro em seu Inciso I que ideias, projetos, enciclopédias e compilações (aquele negócio de tirar um pedaço de uma criação anterior para inseri-lo em uma dissertação de Doutorado ou num artigo de jornal, convencionalmente chamado de epígrafe ou citação), mesmo que registrados no EDA, não são protegidos na forma da Lei. Entendeu? Tentarei ser mais claro usando a High-tecnology (Ugh!) norte-americana. Ou seja, juntou vários textos de vários autores num livro só, nem sempre precisará pagar direitos autorais desde que os mesmos tenham partido desda para melhor há mais de 70 anos. Grosso modo falando, juntou Pablo Neruda e Octávio Paz numa só edição (coletânea), não precisa pagar nada para os infelizes herdeiros.

Para finalizar, quase não acreditei que a controversa e pretensiosa Lei 9.610/1998, possa ter nascido, plena era da informática globalizante, descuidada dos estupros "autorais"; ocorridos, 24 horas por dia, na rede mundial de computadores, subtenda-se Internet. Num primeiro momento pasmei em saber que a legislação utilizada pela EDA não tem como fiscalizar o que se "baixa" sem pagamento de direitos autorais na Internet. No segundo seguinte a essa constatação, o alívio chegou ao descobrir que atualmente ninguém pode patrulhar eficientemente o que se faz nos computadores espalhados pelo Mundo. Ou seja, ainda não se descobriu um meio eficaz para punir um indivíduo que comete um crime autoral no Japão, utilizando-se de um provedor australiano, tendo como objeto desse crime o estudo de um cientista que se encontra na Inglaterra. Que legislação aplicar para punir o infrator japonês? A do seu país, a da Austrália ou a da Inglaterra? Quiçá, um tratado ou leis de usos e patentes dotados de jurisdição internacional. Até que isso procede. Nos últimos anos, surgiram alguns novos acordos internacionais promovidos pela Organização Mundial de propriedade Internacional - OMPI, com o intuito de começar a pôr ordem na casa. Tais acordos já estão repercutindo nas legislações nacionais dos países que aderem de forma cada vez mais representativa às suas posturas regulamentadoras. Tribunais Internacionais de Arbitragem também estão sendo criados para combater o mal maior do "samba do 'tudo pertence a todos'"; criado pela Internet: A reprodução e multiplicação indevidas de obras individuais, paralelamente buscando uma constitucionalidade que ampare e garanta os direitos legais da obra intelectual diante do atual quadro de digitalização que se instala no planeta. Haverá, pois, de chegar o dia, em que os royalties, os copyrights (pena não haver como evitar tais terminologias), serão defendidos e cobrados de forma absolutamente justa, satisfazendo interesseiros e interessados. Afinal, o que seriam dos iluminados criadores, não fossem as criaturas e os vis mortais que as admiram? Fico por aqui.

P.S.: Aos menos avisados, já existem mecanismos criados e batizados por aqui como “farejadores”, que interceptam textos ou excertos retirados indevidamente de textos e afins da rede internacional de computadores. Os plagiadores que se se cuidem.

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Túlio Monteiro - escritor, biógrafo, pesquisador, revisor e crítico literário, publica todas as segundas aqui no Evoé! Leia também Literatura com Túlio Monteiro.

7 comentários:

  1. Muito interessante, oportuno e esclarecedor, nesses tempo de absolutismo e leviandade cavalgantes. Parabéns pelo serviço de utilidade pública!

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    1. Por nada, amiga Suely. Vez por outra é bom que os autores saibam de seus direitos. Grato pelo comentário. Túlio Monteiro.

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  2. Globalização versus individualidade... Criação literária científica versus baboseiras virais... é nobre escritor o que se verifica com bastante clareza é que sempre haverá um ou mais espertalhão para se beneficiar do trabalho intelectual (ou não) de outrem. Mas, o que fazer a velocidade das redes sociais, internets, intranets, tuiteres (sei nem escrever) blogs...enfim, de certa forma contribuem em muito para disseminar informes, fatos, noticias, boatos e infelizmente até crimes... será irreversível o dito progresso(pergunta de dificil resposta) por outro lado, como tudo na vida, uns vão ganhar sem o menor esforço e os autores, bem os autores , ficam sem o vil metal, mas de certa forma (acredito eu) felizes por verem suas obras ganharem o mundo em segundos...

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  3. Eita cabra danado esse Clauton Monteiro. O homem tem resposta para tudo que é postado aqui. Obrigado por mais um excelente comentário. Túlio Monteiro.

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